Entrevista com Ana Cardoso, de "A Mamãe é Rock"

4.7.16


ENTREVISTA

 "Eu não sou um exemplo de mãe, sabe?" 
 
Ana Cardoso faz parte do time de mães que querem ter a sua voz ouvida e reconhecida. Em A mamãe é rock, nada de flores, ursinhos carinhosos e mimimi. Ana fala sobre mães de verdade, que vivem todo dia na corda bamba. Foi pensando em situações verdadeiras, mas sem perder o senso de humor, que a jornalista deu vida a um livro que toca do início ao fim o ritmo que só as mulheres com filhos entendem.
Belas-Letras: Quando foi que surgiu a ideia de criar A mamãe é rock?
Ana Cardoso:
 Em março desse ano, na véspera de embarcarmos para o SXSW, em Austin, o Gustavo (publisher), passou em nossa casa para falar deO papai é pop 2. Na ocasião, o Marcos comentou que gostaria de incluir uns textos meus no segundo livro. Escrevi uma porção deles no bloco de notas do celular e passei para o meu marido, que encaminhou para o Gustavo. Os dois devem ter gostado, pois imediatamente me sugeriram que eu tivesse meu próprio livro.

BL: Por que o papai é pop e a mamãe é rock?
Ana:
 Em primeiro lugar porque eu nunca fui pop. Eu não sou um exemplo de mãe, sabe? Sou uma mulher que tem filhos, vive longe da família e se vira da melhor forma que consegue. Em segundo porque sempre achei a maternidade uma grande mistura de ritmos, pendendo muito para o rock.

BL: No livro, percebemos que você não concorda com diversos estigmas estabelecidos no mundo das mães. O que mais te deixa furiosa neste aspecto?
Ana:
 Furiosa? Então vamos ao cerne: existem cobranças em cima das mães absolutamente diferentes das em cima dos pais. Num ambiente de trabalho, por exemplo, quantos pais faltam para cuidar dos filhos? Uma vez uma amiga mãe escreveu no meu Facebook "Encontrei teu marido num voo sozinho com a Aurora. Ela estava aprontando muito, puxava a barba dele. Olha, dá meus parabéns pra ele, é um super-herói". Aquilo me deixou em estado de choque. Como assim? Eu sempre viajava, fazia tudo tudo tudo com as duas sozinha e eu deveria dizer ao meu marido que ele era um herói porque pegou um voo de 45 minutos com UMA filha? Eu senti que precisava falar sobre isso.
BL: Qual é a maior dificuldade em criar duas crianças de diferentes idades simultaneamente, nos dias de hoje?
Ana: 
Acho bem tranquilo. A Anita é sete anos mais velha, ela me ajuda muito a cuidar da Aurora. Imagino que criar dois pequenos ao mesmo tempo seja mais complexo. Sempre brinquei que eu não teria sanidade mental para isso. Acho que não teria mesmo.

BL: Você é mãe de duas meninas e é feminista. É difícil prepará-las para que exijam seus direitos? Como é essa conversa?
Ana: 
Não é difícil. É bem simples porque faz parte do meu dia a dia. Eu ensino as ideias na prática, é um processo natural. Acho que está interiorizado nelas. A Anita tem dado provas incríveis de como uma educação feminista cria meninas mais questionadoras e fortes. Sou suspeita para falar, mas a Anita é demais. Uma menina inteligente, sensível, forte e guerreira. A hipocrisia passou longe. A Aurora já entendeu que NÃO é NÃO. Ela repete isso o tempo todo, principalmente quando a Anita faz algo que ela deixou bem claro que não queria. Lembro que há pouco tempo ainda se propagavam aquelas ideias que quando uma mulher dizia NÃO não verdade estava fazendo charminho, que queria sim algo. Esse é um conceito que está absolutamente claro aqui em casa.

 
"Só se torna pai de verdade quem participa." 


BL: Ainda existem pais que se recusam a fazer tarefas básicas, afinal, trocar a fralda é o básico! O que você diria para essas esposas?
Ana:
 Não façam. Deixem as crianças com os pais e façam eles se virarem um pouco. Só se torna pai de verdade quem participa. Ao contrário da maternidade, que é compulsória – pariu é mãe – a paternidade ainda parece ser opcional na nossa sociedade. Cabe às mulheres exigirem isso. Quando me perguntam: qual o segredo para ter um papai pop em casa? Ou falam que sonham com um marido que seja um décimo do "bom pai" que o Marcos é, aviso: só depende de vocês delegarem tarefas. Nenhum homem vem de fábrica pronto pra dividir. Eles foram educados a não participar. Então, a mudança está nas mãos das mulheres.

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